Recuperação está em marcha, mas baixo pagamento e ausência de conexo no streaming são problemas a resolver
De São Paulo
O recém-divulgado Relatório Anual do Ecad, com os resultados de um 2021 ainda duramente impactado pela pandemia, faz antever um cenário melhor para o mercado musical nos próximos meses. São evidentes os sinais de recuperação do segmento de música ambiental (37% foi a alta na arrecadação de Usuários Gerais, categoria que inclui bares, restaurantes, lojas, hotéis etc., depois da forte queda de 2020), e ainda mais clara é a expansão contínua do digital: só no ano passado, o salto foi de 36,6%. Ao lado da TV aberta, que ainda responde, sozinha, por 41% do total, esses foram os segmentos mais decisivos para que a arrecadação ultrapassasse a barreira do bilhão de reais pela primeira vez desde 2019, totalizando R$ 1,08 bilhão.
Mas se, por um lado, o streaming ajudou as indústrias culturais e criativas a não terem um tombo ainda maior neste último biênio marcado pela Covid-19, por outro é uma fonte pagadora de valores relativamente baixos, muito inferiores aos que vêm de segmentos fortes como a TV aberta, que vai perdendo participação pouco a pouco. Uma análise da arrecadação por segmento desde 2018 mostra que a TV aberta, com algumas oscilações, vem cedendo espaço na mesma proporção em que o streaming sobe.
Melhorar os valores repassados pelas plataformas, portanto, e incluir também o direito conexo (aquele dos intérpretes e músicos acompanhantes), algo que a TV aberta paga, são desafios importantes para garantir que a gestão coletiva continue a crescer.
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Um segmento-chave que continua com resultados muito baixos é o de shows e eventos. Ano passado, representou apenas 4% da arrecadação, contra 5% em 2020 (um exercício em que a pandemia começou a afetar essa rubrica apenas em março) e 16% em 2019. Ou seja, há muita margem para crescimento, e a retomada dos festivais e shows em 2022 mostra que o mercado vai por um bom caminho.
Já o rádio tem dado mostras de resiliência: muitas vezes dado como "morto" enquanto o streaming avançava, esse meio segue firme como uma fonte pagadora vital. Em 2021, foi responsável por 11% do total arrecadado com gestão coletiva musical, contra 12% em 2020. E o cinema, que registrou o mesmo 1% do total arrecadado nos dois últimos anos, tenta manter sua relevância à medida que o velho modelo da exibição em salas, fortemente impactado pelo streaming de vídeos, luta para se recuperar do confinamento e da fuga de espectadores provocada pela pandemia.
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Uma prova de que a recuperação, ainda que tímida, contempla diferentes segmentos é que o número total de titulares beneficiados ano passado por pagamentos de direitos de execução pública cresceu em relação a 2020. Essa descentralização é evidentemente desejável, ao permitir que o bolo arrecadado chegue a mais pessoas. Em 2021, foram 267 mil os titulares que receberam algo, 1,8% mais que os 263 mil do ano anterior. Juntos, eles dividiram os R$ 901 milhões distribuídos, um valor quase 5% menor que os R$ 947,9 milhões de 2020.
Há de se ter em conta, porém, que essa queda se deu sobretudo por ajustes na distribuição, já que o Ecad e as suas associações haviam feito grandes antecipações no ano anterior para auxiliar os titulares no momento mais duro da pandemia. Outra razão para o resultado inflado da distribuição de 2020 foi o enorme esforço das equipes de identificação para distribuir R$ 170 milhões de créditos até então retidos e que eram referentes a exercícios anteriores. O resultado de tudo isso é que o montante distribuído em 2020 acabou sendo maior do que os R$ 905,8 milhões efetivamente arrecadados naquele exercício.
O bem-sucedido trabalho de gestão de recursos e pessoas com cada vez menos custos é resultado de constantes investimentos em tecnologia — que permitiram, por exemplo, que ano passado fossem cadastradas 16 milhões de novas obras, contra 14,5 milhões em 2020. É o que explicou Isabel Amorim, superintendente do Ecad, numa carta que acompanha o mais recente relatório:
"Para permitir o avanço do trabalho nas atividades de arrecadação, identifiação de músicas e distribuição, o apoio tecnológico é indispensável. Lidamos com um volume de dados cada vez maior e com dinâmicas complexas, e o investimento em TI acompanha as necessidades que identificamos. Na esfera administrativa, os números comprovam que a gestão do Ecad se provou bem-sucedida. Seguimos atuando em todas as nossas frentes de trabalho com eficácia e com um intenso monitoramento de custos, sempre reforçando nossos controles internos de despesas, de compras e negociações, além das áreas de Auditoria e Compliance, a cada ano mais presentes em todas as nossas atividades."
Confira mais números e detalhes sobre o ano passado para a gestão coletiva musical baixando o documento completo com o Relatório Anual 2021 do Ecad aqui.