Com 60 anos de idade e 30 de carreira solo, a artista conta detalhes sobre seu novo disco de remixes e fala sobre a maturidade profissional
Por Akemy Morimoto, do Rio
Aos 60 anos, com 40 na música e 30 em carreira solo, Fernanda Abreu sabe conduzir um baile como ninguém. Nome essencial de uma geração que ajudou a moldar o pop brasileiro na década de 80, com a banda Blitz, a cantora tomou as rédeas da sua própria carreira, construiu uma imagem única e trilhou um caminho vitorioso. Quem acha que o currículo de peso e recheado de sucessos foram suficientes para Fernanda cair na comodidade se engana. A artista segue repleta de planos e acaba de lançar “Fernanda Abreu: 30 Anos de Baile”, em que volta às pistas de dança com um disco de remixes de alguns dos seus maiores hits. Uma espécie de tributo à sua relação longeva com os DJs.
Em um bate-papo por vídeochamada, a rainha da música de baile contou sobre seu novo álbum — que reúne 15 DJs e produtores dos mais diversos segmentos da música eletrônica brasileira, como Gui Boratto, Bruno Be Fancy Inc, além de contar com a participação dos rappers Emicida e Projota —, a maturidade na carreira e os processos de criação na pandemia.
O seu disco traz muitas participações de DJs jovens que atingem um público também muito novo, como Vintage Culture, Tropkillaz e Dennis DJ. Seu objetivo é popularizar ainda mais os seus sucessos para a geração Z, como uma espécie de “revitalização” das obras?
Apesar de serem (músicas) compostas nos anos 90, elas conseguem ultrapassar “essa coisa” da data e virar um disco muito atual. As pessoas comentam que música pop é muito descartável e efêmera, então, é legal mostrar para essa geração nova ver que é possível fazer uma carreira pop de 30 anos de longevidade. Essa cena dos DJs da pista de baile sempre me acompanhou, desde o primeiro disco. As linguagens dos DJ são todas muito próprias e diversas, então, tornou o disco bom de ouvir, não ficou cansativo e trouxe esse ‘frescor’. Não são todos com BPM 130, cada um tem uma levada, então eu fiquei muito satisfeita.
Como foi a produção de “Fernanda Abreu: 30 Anos de Baile”?
Os DJs escolheram as músicas, eu apenas convidei todo mundo. Por incrível que pareça, não teve um DJ que quis a mesma música que outro. As coisas foram fluindo muito bem, e senti que eles capricharam nos remixes. Eu gravei todas as vozes de novo, não tinha a minha voz antiga ali. Fui pro estúdio, gravei as vozes inéditas bem “na onda” do original. Foi uma experiência incrível, o Memê (diretor artístico do projeto) mesmo falou ‘Fernanda, você está cantando no mesmo tom de 30 anos atrás”.
Você acha que o seu disco foge de um certo padrão atualmente imposto pelo mercado musical, como a necessidade de lançar um single por mês?
Nunca foi muito a minha onda ficar seguindo padrão. Eu sempre quis quebrar isso aí e fazer o que eu acho que tem que ser feito. Esse disco foi um pouco disso mesmo, eu poderia ter feito quatro remixes, mas achei que era bom fazer um álbum. Traz uma consistência pro trabalho, traz um peso. Isso ficou muito claro nesse lançamento. Eu tive uma (repercussão na) mídia gigante, as pessoas se interessaram muito. Então, senti que o disco teve o peso que ele merecia. Não dá pra gente ficar nesse padrão, e eu acho que “essa coisa” da gente ser escravo das plataformas, de toda hora estar lançando um single, isso dilui um pouco… Eu acho meio over, as pessoas esquecem rápido.
“Kátia Flávia'' é uma canção de 1987, de Fausto Fawcett e os Robôs Efêmeros, que se tornou um grande sucesso dez anos depois na sua voz. Como foi para você reviver a gravação do clipe dessa obra atemporal?
Foi uma música que tocou muito nas pistas, e eu fiz um clipe original incrível, é um dos clipes que eu mais amo. Para o disco novo, eu nem chamo de clipe, chamo mais de visualizer, porque ele não teve orçamento de videoclipe. A gente quis fazer uma coisa “na onda” de pista mesmo. Chamei dois bailarinos que fazem shows comigo, fomos pro estúdio, ficamos ouvindo a música e criando a coreografia na hora. Foi superdivertido.
Ano passado, em conversa com a UBC, você falou sobre os seus planos para um álbum só com mulheres, nomeado “Garota Sangue Bom”. Aparentemente, o projeto mudou para “30 Anos de Baile por Elas” (nome provisório), mas a ideia de criar um disco só com mulheres continua. Para você, qual a importância de exaltar mulheres dentro da música?
Eu acho fundamental, a cena pop cresceu muito, e as mulheres estão dominando, como Anitta, Ludmilla, Iza, Luiza Sonza, Jade Baraldo… A gente tem uma quantidade de meninas fazendo música pop, hoje, que tem a ver com a minha linguagem, com beat, com música eletrônica, com música feita por DJ. O meu próximo projeto, que eu vou começar agora, no meio de outubro, é o “Fernanda Abreu: 30 Anos de Baile Vol 2", por DJs mulheres.
Seu amor pelas pistas de dança é o motivo do lançamento deste disco, mas ficar longe dos palcos deve ser ainda mais dolorido. Como está sendo a pandemia para você?
Eu pisei profissionalmente no palco em 1981. Em 40 anos, não me lembro de ter ficado longe do palco mais de três meses, mesmo com as minhas duas gravidezes. Não me lembro de ter ficado um ano e meio sem ouvir o aplauso do público, foi muito difícil, fiquei com muita saudade. Esse disco estava pronto no começo do ano, mas eu resolvi não lançar, porque a pandemia tinha piorado, não era a hora. Aí, quando começamos a vacinar e começamos a ver realmente a eficácia da vacina, para começar uma luz no fim do túnel, eu decidi lançar. Trocar a chave da nossa vibe, começar a pensar mais positivo, ter uma música para mexer o nosso corpo, que está parado em casa. Foi importante vir nessa hora.
De “musa gatinha” da blitz você se transformou em uma mulher madura que assumiu as rédeas da carreira. Como você enxerga esse amadurecimento?
Quando eu comecei a minha carreira, ficou muito impresso a “Fernandinha da Blitz". Na minha carreira solo, eu vim com outra pegada, que foi instantaneamente impressa para o público. Desde que eu comecei a minha carreira solo, ninguém da plateia pediu para eu cantar uma música da Blitz, então, acho que houve esse corte muito claro na cabeça das pessoas. Pra mim, o que amadureceu foi o próprio processo da carreira solo, eu consegui criar uma linguagem musical própria, uma assinatura minha, eu trabalhei com equipes muito bacanas, aprendi muito esse tempo todo. No fundo, não tem muita diferença daquela menina de 20 anos, porque eu continuo com a mesma vibe, a mesma vitalidade e energia para conseguir realizar meus projetos (que são muitos ainda).
Confira “Fernanda Abreu: 30 Anos de Baile”
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