2ª Seção do tribunal decide favoravelmente ao Ecad ao analisar recurso especial repetitivo, consolidando quatro teses que beneficiam diretamente os criadores; entenda
Do Rio
A quarta-feira, 24 de março, ficará marcada como um dia histórico para os autores musicais brasileiros. Em decisão que pacifica de uma vez a várias vezes questionada cobrança de execução pública pelas músicas tocadas em quartos de hotéis, pousadas, camarotes de navios e estabelecimentos congêneres, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) voltou a dar a razão aos criadores: a cobrança é justa e será mantida.
A 2ª Seção do STJ, que trata, entre outros temas, de questões ligadas aos direitos autorais, decidiu unanimemente em favor do Ecad e dos autores ao analisar um recurso especial repetitivo, cujo resultado positivo para os interesses dos compositores gera uma jurisprudência que deve ser reproduzida em instâncias inferiores e barra futuras ações sobre o tema no próprio STJ. Além disso, o desenlace deve influenciar o debate no Congresso, onde projetos de lei tentam emplacar a tese de que os quartos de hotéis seriam ambientes exclusivamente privados onde não incidiria a execução pública.
Como não há base legal para tornar a disputa entre o setor hoteleiro e os autores uma questão constitucional, o debate tem pouquíssimas chances de ser admito no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF), tornando o STJ a instância judicial definitiva. “Foi uma vitória muito importante de uma batalha que acontece há décadas, desde a anterior lei de direitos autorais, de 1973. São quase 50 anos de questionamento que finalmente chegam ao fim. Trata-se de um avanço muito grande e a confirmação de que a legislação prevê essa modalidade de cobrança”, resume Sydney Sanches, advogado especialista em direitos autorais e assessor jurídico da UBC.
De acordo com ele, a análise desse incidente processual permitiu que quatro diferentes teses fossem finalmente firmadas inequivocamente. São elas:
É devido o direito de execução pública em quartos de hotéis e todos os outros serviços de hospedagem, independentemente de como a música é disponibilizada, seja através de aparelho no quarto ou do oferecimento de conteúdo audiovisual através de televisão.
O conceito expresso na lei do turismo, que define os quartos de hotéis como ambientes privados, o que vinha motivando a argumentação de que não cabia execução pública, também foi afastado. Não há dúvida de que o quarto de hotel tem privacidade para aquele que o utiliza durante a hospedagem, mas é de frequência coletiva e de frequente circulação. Portanto, é perfeitamente devida a execução pública pelas músicas ali tocadas.
São legítimas as tutelas inibitórias quando ocorrer um uso não autorizado. Ou seja, o Ecad, órgão de cobrança, está autorizado a barrar o uso de músicas pelos que desobedecerem a lei e se recusarem a pagar, sob pena de multa diária.
Não se trata de dupla cobrança. Hotéis e estabelecimentos similares argumentavam que, no caso da oferta de conteúdo audiovisual por meio de televisão por assinatura ou plataformas digitais, não caberia uma “nova cobrança”, já que as plataformas e TVs pagam os valores referentes à execução pública. A tese foi desmontada. Para o STJ, trata-se de um uso de conteúdos por terceiros distinto ao uso original (como ocorre, por exemplo, quando um bar deixa uma TV ou um rádio ligados como sistema de entretenimento para seus clientes). Portanto, incidem nova autorização de uso e novo pagamento.
Fique ligado nos canais informativos da UBC e acompanhe as próximas movimentações no Congresso dos projetos de lei que tentam mudar a legislação, excluindo expressamente a cobrança pelos quartos de hotéis.