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Versões: tradição na música brasileira que se renova
Publicado em 29/07/2021

Entenda o processo de composição e conheça direitos autorais dos versionistas 

Por Akemy Morimoto, do Rio

De canções surgidas no movimento da Jovem Guarda a temas infantis, muitos hits nacionais são versões de músicas originais internacionais. Esse modelo sempre marcou presença no cancioneiro popular brasileiro e foi o responsável por grandes sucessos, graças ao trabalho impecável dos versionistas, que, mais que fazer versões literais, precisam adaptar a mensagem ao contexto cultural nacional e se preocupar com a rima e a métrica da obra original.   

Autor dos versos em português para “Lately” (“Quando Te Vi”) e “Till There Was You” (“Nada Mais”, gravada por Gal Costa), Ronaldo Bastos é considerado um dos grandes versionistas brasileiros. 

O compositor e produtor, que também é curador das playlists da UBC juntamente ao produtor Leonel Pereda, conta como é o seu processo de composição de versões:

“Meu processo é uma mistura do que eu faço quando escrevo letras em cima de melodias e da tentativa de traduzir a ideia geral da canção original. Versões raramente podem ser literais. É necessário que soem bem na nova língua, que sejam musicais.”

Mas, para além de ser um renomado versionista, Ronaldo Bastos é um grande letrista. Sua obra "Nada Será Como Antes", criada com Rene Vincent, ficou conhecida na voz de Milton Nascimento, mas ganhou diversas versões em inglês gravadas por Flora Purim (1977), Sarah Vaughan (1987) e Brian Auger & Julie Tippetts (1991). A versão de Sarah Vaughan foi incluída no disco "Brazilian Romance". Ronaldo conta que ficou lisonjeado com tantas versões, em especial a de Sarah:

“Eu gostei muito dessa gravação, e é claro que é um luxo ter uma canção gravada pela diva. Ao longo dos anos, várias pessoas, especialmente do universo do jazz de diferentes partes do mundo, regravaram essa música que virou um standard.”

Quando se trata de canções com temática infantil, Vanessa Alves é especialista. Com mais de 400 músicas gravadas por artistas renomados, Vanessa tem sucessos mundialmente consagrados na área de entretenimento, como as versões “Cinco Patinhos” e “Cabeça, Ombro, Joelho e Pé”. 

“Lembro que teve compositor renomado dizendo que ‘Cinco Patinhos’ era muito ruim. Quando fizemos um show no Maracanã, dias após o lançamento, todo o público cantou a música inteira numa só voz, eu e Xuxa nos olhamos, e ali entendemos que não estávamos loucas em acreditar.”

Criadora da franquia audiovisual "Xuxa Só Para Baixinhos" ao lado de Xuxa Meneghel, ela conquistou seis indicações ao Grammy Latino e duas premiações. Segundo Vanessa, o trabalho dedicado às crianças exige ainda mais responsabilidade e estudo:

“São muitos anos, muitas madrugadas, horas de estúdio e dedicação para compor canções que pudessem deixar uma memória afetiva e especial na vida das pessoas.”
 

DICAS DE RONALDO BASTOS E VANESSA ALVES PARA VERSIONISTAS:


Foto: Ronaldo Bastos/Divulgação

“Recomendo que a pessoa se dedique a cada versão como se fosse uma música própria. Se a música não bateu, dificilmente a versão vai funcionar. A versão tem sempre que ficar mais musical do que literal. Mas dou força aos novos versionistas e compositores. Longa vida à canção popular!”, aconselha Ronaldo.


 


Foto: Thatiana Bione

Vanessa ressalta a importância da pesquisa, do estudo e da intuição:

“Pesquisar e entender o objetivo que você quer atingir são essenciais. Escutar o que o público-alvo gosta e quer ouvir, buscar novas roupagens nos arranjos e ser ousado. Um bom versionista sabe quando acerta, porque o sentimento fala alto na hora que você escuta.”


DIREITO AUTORAL PARA VERSÕES E VERSIONISTAS

Criar uma versão é reinterpretar a expressão do sentimento de um artista. Portanto, é fundamental ter a autorização do autor original e da sua editora, quando houver. 

Antes de ser gravada, uma versão é uma obra, não ainda um fonograma. Portanto, caso o versionista tenha sido autorizado pelo autor original e/ou sua editora a escrever a nova letra, ele também será creditado como versionista.

Se a obra original for estrangeira, o primeiro passo para conseguir a autorização é identificar quem é a subeditora no Brasil (editora local brasileira que tem um contrato de licenciamento com a editora do país de origem da obra). Depois, o versionista deve mandar à subeditora a letra que ele fez em português e em inglês, o áudio e todas as suas especificações, como nome, CPF e dados bancários, para que, se for aprovada a versão, seja celebrado um contrato. A subeditora vai encaminhar os dados à editora original que, por sua vez, os envia a todos os autores da obra original, para que estes decidam se querem ou não autorizar a obra versionada. 

“A letra em inglês ou na língua original da obra é importante porque o autor original quer saber sobre o que a versão está falando. Ele é quem vai autorizar ou não a versão ou até mesmo recomendar alguma alteração, caso não tenha gostado de alguma palavra, por exemplo”, conta o gerente de A&R da UBC, Francisco Ribeiro.

Depois da decisão dos autores, é feito o caminho inverso até que a resposta chegue ao versionista. Normalmente, quem faz todo o encaminhamento deste processo é a gravadora. Como o procedimento depende de muitas “pontas” e, principalmente, da aprovação do autor original, que pode estar em turnê ou em algum outro compromisso, é recomendado que o pedido seja feito com significativa antecedência. 

Após todas estas etapas, caso a obra seja autorizada por todos os autores, a subeditora é a “ponta” responsável por formalizar um contrato de versão, que é enviado para a associação cadastrar a obra no Ecad. O versionista possui os devidos créditos no cadastro e, dependendo da decisão do autor original, ele pode ou não receber um percentual na obra versionada. 

“Na maioria das vezes que o autor original nada concede de percentual para o versionista, a gravadora é quem se dispõe a pagar um valor acordado entre as partes, pois considera que ele teve um trabalho ao fazer a versão e deve merecer por tal tarefa, ou seja, uma remuneração”, afirma Francisco Ribeiro.

É importante ressaltar que, no contrato de versão, constam o autor original, o versionista, a editora original e a subeditora. Segundo a lei, só depois da assinatura do documento a gravação poderá ser feita. 

O versionista também goza de direito moral sobre a versão, isto é, ele pode impedir que a nova obra, versionada, seja utilizada sem sua autorização e para fins que firam suas convicções, por exemplo.

No caso de obras em domínio público, além de não haver mais necessidade de autorização do autor, o versionista tem direito de cadastrar a obra e receber seus direitos autorais pela versão. As obras entram em domínio público após 70 anos do falecimento do autor ou do último autor a falecer, no caso de uma cocriação. Se o autor falecer e não tenha deixado herdeiros, a obra entra automaticamente em domínio público. Estão em regime de domínio público também canções de autor desconhecido, como cantigas de roda, folclore, músicas tradicionais, pontos de umbanda, entre vários outros casos.

As obras versionadas podem ser cadastradas na UBC através da “declaração de obras musicais” ou pelo Portal do Associado. No caso da obra editada, a editora fica responsável por realizar esse cadastro junto à associação.
 

CONHEÇA 10 MÚSICAS QUE SÃO VERSÕES:

Apesar de ser um ‘tiro no escuro’, já que o processo legal envolve diversas questões que podem autorizar ou não a versão da obra original, existem inúmeros sucessos nacionais, como os de Vanessa Alves e Ronaldo Bastos, que representam a categoria. Confira 10 dos maiores:

  1. “Bem Que Se Quis” (Versionista: Nelson Motta / Intérprete: Marisa Monte) - obra original: “E Po’ Che Fa (Pino Daniele)

  2. “Marvin” (Versionistas: Sergio Britto e Titãs / Intérprete: Titãs) - obra original: “Patches” (Ronald Dunbar, General Norman Johnson)

  3. “É Isso Aí” (Versionista: Ana Carolina / Intérprete: Ana Carolina e Seu Jorge) - obra original: “The Blowers Daughter” (Damien Rice)

  4. “Batendo na Porta do Céu” (Versionista/Intérprete: Zé Ramalho) - obra original: “Knockin’ on Heaven’s Door” (Bob Dylan)

  5. “Minha Fantasia” (Versionista: Alexandre Pires / Intérprete: Só Pra Contrariar) - obra original: ““It ain’t over ‘til it’s over” (Lenny Kravitz)

  6. “A Paz” (Versionistas/ Intérprete: Roupa Nova) - obra original: “Heal the World” (Michael Jackson)

  7. “Catedral” (Versionistas: Christiaan Oyens e Zélia Duncan  / Intérprete: Zélia Duncan)

  8. “Não Chore Mais” (Versionista/Intérprete: Gilberto Gil): obra original: “No Woman No Cry” (Vincent Ford)

  9. “Ragatanga” (Versionista: Rick Bonadio/ Intérprete: Rouge) - obra original: “Asereje” (Manuel Ruiz Queco)

  10. “Solange” (Versionista / Intérprete: Léo Jaime) - obra original: “So Lonely” (Gordon Sumner, Intérprete: The Police)

 

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