Conselho Federal da entidade de classe dos advogados vê “graves prejuízos ao setor artístico e cultural” impostos pela MP editada em novembro por Bolsonaro, que libera hotéis, pousadas e navios de pagar direitos de execução pública por músicas tocadas nos quartos e camarotes; ação pede suspensão e inconstitucionalidade da medida
De Brasília
Foto: Comunicação Supremo Tribunal Federal
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) protocolou uma ação no STF para suspender e tornar inconstitucional a isenção de pagamento de execução pública pelas músicas tocadas em quartos de hotéis, pousadas, camarotes de navios e ambientes similares. Parte da medida provisória 907/2019, editada por Jair Bolsonaro há um mês, a isenção fere o direito de milhares de artistas que dependem de pagamentos pelo uso das suas obras, na visão da entidade de classe dos advogados. A ação começou a tramitar oficialmente na segunda-feira, dia 23, e ainda não foi analisada na Corte Suprema.
“A extinção da cobrança dos direitos autorais impõe graves prejuízos ao setor artístico e cultural. A exploração dos conteúdos de rádio e televisão se traduz em proveito econômico por parte dos hotéis e meios de transporte marítimo e fluvial, configurando também atividade de retransmissão de conteúdo”, sustenta a OAB em sua argumentação. “Não seria possível privar os artistas da remuneração ligada à exploração de sua propriedade intelectual”, diz outro trecho da ação.
Apesar de o Judiciário estar em recesso, há uma expectativa de que o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, em regime de plantão, possa decidir algo estes dias. A relatora do processo, no entanto, é a ministra Rosa Weber, que pode ter que assumi-lo caso não haja um pronunciamento de Toffoli antes do fim do período de descanso.
A OAB pede uma decisão liminar que suspenda os efeitos desse trecho específico da MP, conhecida como “A Hora do Turismo”, e que, segundo Bolsonaro, foi desenhada para “estimular o setor turístico”. O Conselho Federal da entidade representativa dos advogados solicita que a Corte, ao julgar o processo, declare a isenção inconstitucional.
Na MP, Bolsonaro extinguiu a Embratur, substituída por um órgão de menor gama, a Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo. As outras medidas de fomento ao setor não foram questionadas pela OAB.
De acordo com o Ecad, o prejuízo aos autores, caso a isenção não seja derrubada de alguma forma, podem chegar a R$ 110 milhões por ano.
“O valor cobrado por aposento representa, em média, R$ 0,60 por diária, sendo que, de acordo com o município em que está localizado o hotel, concedemos um desconto de região socioeconômica, previsto em nosso regulamento, que varia entre 15% e 60%. Além de serem retirados da cadeia produtiva musical, estes valores certamente não influenciarão na diminuição do valor das diárias dos hotéis, representando, única e exclusivamente, um benefício injustificado para o empresariado em detrimento dos artistas”, disse a superintendente executiva do escritório central de arrecadação, Isabel Braga, em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”.
Caso o Supremo não se pronuncie sobre a norma ou a mantenha, ainda há outro caminho para os compositores. Isso porque o Congresso deve ratificar (ou não) a MP até o fim de março. Por isso, já teve início uma campanha de pressão sobre os congressistas cujo objetivo é sensibilizá-los sobre a importância da arrecadação de direitos autorais para o sustento de milhares de titulares que vivem das suas criações. Um grupo chamado Compositores do Brasil publicou na plataforma change.org um abaixo-assinado que, nesta quinta-feira (26), já passa de 15 mil assinaturas. A meta é alcançar 25 mil.
No último dia 9 de dezembro, a Cisac, Confederação Internacional das Sociedades de Autores e Compositores, que representa 230 sociedades de gestão e milhões de autores no mundo todo, publicou uma nota na qual avalia com preocupação a isenção do pagamento de execução pública previsto na MP. No comunicado, a entidade ressalta que o documento publicado por Bolsonaro viola obrigações internacionais assumidas pelo Brasil em tratados dos quais o país é signatário e vai contra a própria Constituição Brasileira. Além disso, a Cisac destaca uma decisão do Tribunal de Justiça Europeu de 2006 em que foi corroborado que o sinal recebido por um hotel para os televisores instalados nos quartos constitui um ato de comunicação ao público.
Fique ligado nos nossos canais digitais. Ante qualquer decisão do STF, você saberá por aqui.
LEIA MAIS: O comunicado completo da Cisac